Não bastasse a descoberta de que a toda-poderosa Federal Aviation Administration, a agência que controla a aviação civil nos EUA, acobertou falhas sérias e propositais de manutenção em jatos antigos da Southwest (permitindo que voassem sem passar por revisões obrigatórias pela idade) e depois forçou centenas de aeronaves a uma manutenção não programada (a exigência de revisão no cabeamento do trem de pouso deixou em terra toda a frota de MD-80 e MD-90 do país e arrastou Frontier e Aloha para a concordata), um novo escândalo abala a reputação técnica da instituição. Trata-se da descoberta de que a agência simplesmente encobriu a denúncia, grave, de que os gerentes de controle de vôo do aeroporto de Dallas-Fort Worth, no Texas, haviam transferido para pilotos a responsabilidade por uma série de falhas ocorridas durante aproximações, decolagens e pousos no terminal, um dos mais movimentados do país.
A revelação joga mais uma pá de desconfiança em cima de uma reputação trincada pela sucessão de escândalos. A decisão de obrigar as companhias a realizarem inspeções não-mandatórias (que poderiam ou não ser feitas, dependendo da decisão do setor de manutenção de cada empresa) soou como a tentativa de trocar a fechadura depois da porta arrombada. Todo mundo obedeceu temendo que a recusa afetasse a confiança no negócio. Agora, a sensação de que todo o setor está meio abandonado deve aumentar: houve a confirmação de que os gerentes de DFW havia encoberto os erros, mas as autoridades se recusam a revelar o restante dos dados que constam nessa investigação. O público tem o direito de saber que correu riscos em função da falta de seriedade de uma meia dúzia. Sabe-se apenas que os controladores erraram na distância regulamentar entre as aeronaves - que voaram mais próximas do que deveriam - além de repassar instruções erradas ou tardias aos cockpits.
O relatório sobre os erros encobertos inclui 62 incidentes classificados como falhas de pilotagem em um periodo de 20 meses encerrado em julho do ano passado. Desses, depois de um levantamento, descobriu-se que apenas 25% deveriam ser tratados dessa forma. De acordo com a sindicância conduzida por um funcionário do Departamento de Transportes - independente da agência - os gerentes que maquiaram os incidentes o fizeram principalmente para aumentar o ganho financeiro com bônus por performance, em cujo cálculo as taxas de erros são um elemento essencial. O traço corporativo evidenciado pela recusa em revelar a identidade dos envolvidos reaparece também nessa questão: em vez de aprofundar a deliberação sobre as raízes e a extensão dessa manipulação, as autoridades preferiram discutir uma forma de mudar o cálculo dos bônus. E mais: embora reconheçam que a maquiagem tenha prejudicado a elaboração de estatísticas que são vitais ao desenvolvimento de mecanismos de segurança de vôo, nada pretendem fazer para criminalizar tais atitudes. É o caso de se perguntar: se o cálculo do bônus vale para todos os gerentes desse sistema, que garantia o passageiro nos EUA tem de que outros funcionários não estariam, ou continuaram, maquiando as próprias estatísticas com o mesmo fim? Dados os interesses em jogo, é difícil acreditar que alguém envolvido com esse tipo de atividade em Nova York, por exemplo, não possa ter mexido nos números para ganhar mais um trocado.
Por enquanto, os dois principais envolvidos no caso não foram punidos. Tanto o gerente de operações de tráfego aéreo de DFW quanto seu sub perderam os cargos, mas continuam funcionários e trabalhando, porém em outra área da agência no aeroporto. O que indica que gozam tanto da estima quanto da confiança dos seus superiores. Estes, confrontados com a possibilidade de a prática ser tão disseminada que todas as estatísticas poderiam estar vivciadas, disseram acreditar piamente que o ocorrido dem DFW é um fato isolado e que certamente outros profissionais não agiriam da mesma forma. Com chefes camaradas asssim, deve ser bom mesmo trabalhar na FAA. A instituição se defende dizendo ter retirado dos gerentes a prerrogativa de analise, que teria sido transferida a outros funcionários da instituição porém de fora dos centros de operação. Além disso, estão instalando softwares especiais capazes de detectar e compilar tais incidentes de forma independente. No Congresso, no entanto, há pouca certeza de que as medidas adotadas conseguirão mudar uma cultura de décadas de falta de controle. Um dado corrobora esse aspecto: a denúncia de que os erros estavam sendo maquiados surgiu pela primeira vez em 2004, levada aos superiores por um controlador de tráfego. Na mesma época, outra sindicância concluiu que havia desvio e que eles já vinham sendo praticados há sete anos. Também se falou no relatório da possibilidade de mais funcionários praticarem a maquiagem em outros locais. Ainda assim, as decisões tomadas naquela época de não serviram para impedir que se repetissem - ou que continuassem ocorrendo.
Fonte: JB Online - SLOT